segunda-feira, 8 de novembro de 2010

HISTÓRIA DA NOITE MIL E UMA

Quem m'a contou foi a Annie, inglesa que conheci em Afife.
( - Em que outra parte poderia ser? )

Bem, esta inglesa é mesmo Inglesa. Magra e do alto dos seu metro e oitenta e tal,  lá me contou a sua vida.
Apesar de perto dos sessenta, bem se poderia imaginar que, de facto, aos vinte anos, deveria ter sido uma mulher de fazer parar o trânsito. O que, segundo ela, tinha mesmo acontecido nas ruas de Roma ou de Atenas por onde então se passeava graças a um desafogado casamento com uma das maiores fortunas lá do Reino.

Ora acontece que a visão que me tocou não foi exactamente essa, como devem compreender. Mas dava para acreditar pois e apesar dos seus cinquentas e tais, eu vi a Annie, em Afife, fazer parar um carro de vacas! Como na Inglaterra se conduz pela esquerda, a minha amiga entrou na faixa contrária na bifurcação da Estrada de Cabanas com a de Agrichousa e o carro da vaca só da Senhora Glória do Léria teve mesmo que parar.

O certo é que aquele monumento clássico resolveu ser romântica aos quarenta anos e divorciou-se!
Dedicou-se à poesia e à culinária. O meu amigo Tone da Quinta, que também se dedica à culinária, diz que é jazz. Tendências. Enfim!
Voltando à minha amiga Annie diria que mesmo aos quarenta seria sempre uma idade prematura para se ser romântico. Isso só deve acontecer depois dos sessenta! Antes disso é uma chatice. Perde-se um tempo imenso e corre-se o risco de não se ser compreendido! O que acontece na maior parte das situações.

Ora a minha novelista improvisou, ali no Bar da Praia do Senhor Carvalho, um conto lindíssimo acerca de uma certa princesa árabe. O Senhor Carvalho nunca sonhou o delírio artístico que aquele vinho branco azurrapado, de que nem me lembra a marca, poderia provocar. A narrativa era em inglês e expontânea como já disse. Pedi à Annie que m'a passase a escrito. Não tendo essa versão vou relatar de cabeça pelo que peço desde já compreensão para os lapsos da memória ou qualquer erro de tradução! Mesmo não havendo do leitor qualquer possibilidade de os detectar.

Tratava-se de uma princesa árabe, de rara beleza, com um monte de pretendentes. Na história entrava um Sheik que lhe propôs casamento oferecendo-lhe todos os bodes do seu rebanho. Ela recusou. Não casaria
com ele pelos bodes. Mas o Cavaleiro do Deserto não desistia. Casa comigo, filha de Assude, dar-te-ei todos os meus carneiros.
- Não casarei contigo pelos teus carneiros. Respondeu a princesa de olhos cintilantes.
Desesperava o Tuaregue que numa última tentativa lhe ofereceu todos os camelos da sua caravana para que o aceitasse como esposo.
- Guarda os teus camelos. Não me casarei por eles. Recusou a obstinada Sherazade
O desànimo deu tempo a que o nosso Omar Shariff matutasse de tal forma no assunto que, num repente iluminado pelo sol escaldante, decidiu uma coisa muito simples. Não compreendia as sucessivas recusas da nossa heroína, tanto menos que se apercebera daquele brilhosinho nos olhos ( o Sérgio Godinho também deve ter conhecido essa princesa) sempre que com ela falara e iria perguntar-lhe o que é que mais desejava para que se decidisse casar com ele. 
A resposta foi surpreendente pela simplicidade nunca antes vislumbrada.
- Oferece-me o Céu, a Lua e as Estrelas e eu casarei contigo.
Então o nosso Sarraceno pegou na nossa Sarracena, levou-a numa noite, por entre as palmeiras do oásis ( se fosse em Afife seria por entre os fenos dos médos da praia) apontou o Céu, a Lua e as Estrelas e sussurrou-lhe.
- Tudo isto é teu.
E logo alí sarracenaram, perdão, casaram.
Aqui chegados terminava o relato da minha amiga Annie.
E eu, comovido com o desprendimento da Saudita, que tudo tinha recusado em favor do sonho, chorava, chorava!
Chorava de comoção mas também  despedaçado ao pensar no materialismo, na insensibilidade e o no pragmatismo das escandinavas. Principalmente daquelas que e a quem eu ofereci o Céu, a Lua e as Estrelas,
preferiram ficar com os bodes, os carneiros e os camelos.

Tone do Moleiro Novo







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