Já agora aqui vai um texto publicado na A AURORA DO LIMA em 13 de Janeiro de 2006
O Grande Mistificador.
Não! Não se trata de uma qualquer obra de Dali. Se o fosse, no surreal, seria uma obra de arte. Mas como tudo se passa no real é apenas tosco. Uma coisa mais no estilo Pedro Macau.
Isto a propósito, embora assim não pareça, de três notícias vindas a público nestes últimos dias.
- Que a população portuguesa se concentra cada vez mais no litoral do país.
- Que, devido ao despovoamento, a desertificação ameaça já um terço do território nacional.
- Que o mundo rural vai receber, da União Europeia, 7 980 milhões de Euros (mil e seiscentos milhões de contos!) entre 2007 e 2013, para financiamento de programas de desenvolvimento rural e da agricultura propriamente dita.
Ora o descalabro do Ordenamento do nosso País não é de agora nem é coisa que não tivesse sido prevista e para o qual não tivessem alertado observadores e especialistas aquando da nossa adesão à CEE. Mesmo antes e durante. Basta-me citar o arquitecto Gonçalo Ribeiro Telles para nele personalizar todos aqueles que sempre se manifestaram para a necessidade de enquadrar os favores desta nova era, em grandes objectivos nacionais.
Mas aquando da organização territorial e para “sacar” os dinheiros da CEE – ditos fundos estruturais e de coesão – prevaleceu o velho conceito de que Portugal é Lisboa e o Resto Paisagem.
Os fundos comunitários destinavam-se a puxar pelas regiões mais atrasadas e conseguir a coesão entre todo o território. E no acesso a esse auxílio financeiro o principal critério para se considerar uma região habilitada ao objectivo n.º1 dos fundos estruturais era de que essa região não tivesse atingido o tecto de 75% da média europeia medida em termos do Produto Interno Bruto per capita.
Assim sendo a única região do país que à data já tinha atingido esse patamar era precisamente a região da Grande Lisboa o que, por si só, a deixava já de fora dos apoios referentes a esse objectivo nº.1. Lembremo-nos que estamos a falar de 1985/1986 data da nossa entrada na CEE e lembremo-nos de qual o ciclo político que se iniciou nessa mesma data.
Já então e no dia 2 de Janeiro de 1986, o DIÁRIO DE LISBOA dizia em letras garrafais:
“CEE: ACTO DE FÉ – O barco já está a andar, falta saber para onde”
De facto era tudo uma questão de rumo. Tínhamos timoneiro ( dizia-se!) Os fundos da CEE iriam entrar ás “pazadas” e a estabilidade política foi garantida a partir daí, com duas maiorias absolutas consecutivas.
-Então o que é que correu mal?
Voltemos a Lisboa. Dado que a região por si só já não justificava o acesso aos tais fundos de coesão os nossos exemplares estrategos tiveram uma ideia genial. Resolveram criar a Região de Lisboa e Vale do Tejo (RLVT) compreendendo o Distrito de Lisboa, o Distrito de Santarém quase todo, cerca de metade do distrito de Setúbal e cerca de um terço do Distrito de Leiria.
– Sabem porquê?
- Porque como os índices dessas regiões eram de tal forma abaixo dos tais 75%, fizeram baixar o da novel região na sua globalidade permitindo a Lisboa ter acesso a fundos que não teria se considerada isolada. Ou seja meteram Lisboa com o seu avanço no mesmo saco dos Concelhos periféricos mais carenciados. Digam lá se não foi brilhante a ideia.
– Sabem o que aconteceu??
- Nos anos subsequentes Lisboa acabou por beneficiar de um caudal de investimentos – num escalão ao qual não deveria ter acesso - ainda por cima canalizados de uma forma desproporcional e em detrimento das restantes sub-regiões. - Sabem o que aconteceu?
- A Grande Lisboa andou de tal forma para a frente que aí o índice do PIB per capita se afastou dos tais 75% e pesou de tal maneira no conjunto que o próprio índice global da RLVT subiu acima desses mesmos 75%. E se tudo ficasse na mesma, a Região já não teria acesso aos tais fundos do 1º Objectivo, nos novos quadros comunitários de apoio. O que deixaria de fora as sub-regiões periféricas discriminadas e que foram ficando para trás.
– Sabem o que aconteceu???
- Os tais estrategos, em 2002, extinguiram a Região de Lisboa e Vale do Tejo e os municípios inicialmente integrantes nesta, foram distribuídos pela Região Centro e o Alentejo, para que, os Concelhos que dentro da tal RLVT serviram de capacho ao desenvolvimento Lisboeta, continuassem a receber os tais apoios ao nível do 1º Objectivo.
Digam lá que não foi brilhante. Esperteza saloia elevada à condição de Estratégia de Estado diria eu! Mas tais cabeças iluminadas ainda hoje se consideram os maiores.
Alarmam-se agora com todos os desequilíbrios estruturais de que Portugal sofre como se não houvesse responsáveis. Os tais fundos de coesão foram utilizados precisa e deliberadamente em sentido contrário.
Isto tudo a propósito da candidatura Cavaco Silva à Presidência da República em cuja campanha este, por vezes diversas, se tem enfadado com o avivar das memórias argumentando que o que interessa é a acção futura. Ora ao contrário daquilo que pretende, o passado conta pois quando nos apresentamos a um cargo pedem-nos o currículo.
E o que é que Cavaco deixou depois de duas maiorias absolutas?
Um país deliberadamente desequilibrado ( repito, deliberadamente desequilibrado) em resultado das medidas estruturais irreversíveis tomadas precisamente a partir de 1986, quando os fundos de coesão ( coesão linda palavra) entravam a rodos e quando, precisamente, teria sido possível conduzir os investimentos no sentido de equilibrar o País como um todo. Mas, ao contrário, os fundos de coesão foram utilizados para aumentar as assimetrias. O resultado está à vista.
- Quem era o timoneiro???
- Que ideia tinha do País???
- O que é que mudou de lá para cá.???
O Exmo. Sr. Prof. Aníbal Cavaco Silva já há dez anos se distanciou dos partidos ( pelo menos do seu/dele abandonando-o à derrota eleitoral depois de duas maiorias absolutas) e concorreu, com todo o seu curriculum político, à presidência da República julgando que era trigo limpo. Perdeu!
A prova de que o que o movia (move) não era (é) uma ideia para Portugal, mas apenas a necessidade pessoal de colocar a cereja em cima do bolo de uma carreira política que julga brilhante, foi o facto de cinco anos passados não se ter recandidatado. Sabia que era para perder. Mandou para a fogueira o Ferreira do Amaral que lhe fez o frete.
Afinal, passados dez anos, o que é que mudou para, desta vez, votarmos em Cavaco? - Nada!
A não ser a visão concreta do ponto de chegada do tal destino que, em 1986, para o DIÀRIO DE LISBOA ( e não só) era desconhecido.
A não ser a certeza de que o que sobrou; do regabofe, das vacas gordas, do oásis, das enxurradas dos dinheiros da CEE, dos tempos gloriosos do Cavaquismo, foi um país vergado pelo peso do betão e cimento armado, das ICs, das IPs, das Vias de cintura internas, intermédias e externas, a resvalar para o Atlântico, com um terço do território a ficar desertificado e o resto à deriva.
Numa das suas intervenções televisivas Cavaco invocou, em seu abono, Jacques Delors.
É pena que de facto Jaques Delors não esteja presente para se aperceber o que é que se fez com o dinheirinho que disponibilizou a Portugal. Esse senhor veio a Portugal em Outubro de 1988 dar um recado exigindo equilíbrio entre o mundo rural e o Urbano. – Sabem a quem?
Precisamente ao primeiro ministro Cavaco Silva.
– Sabem o que, à data, a propagando cavaquista espalhava aos quatros ventos?
- “Não faltará apoio para desenvolver as regiões” (sic).
E que no imediato só para no plano integrado do desenvolvimento do Norte do Alentejo os custos ultrapassariam os 24 milhões de contos. Voltando ao início deste texto é caso para perguntar qual foi o destino das verbas disponibilizadas pelo amigo Delors. Essas e as outras.
Um dia será feita a história da oportunidade perdida como o foram os tempos da pimenta da Índia, do ouro do Brasil, da exploração colonial e/ou das remessas dos emigrantes.
Até lá, saudações democráticas e se vislumbrarem razões para tal, votem em Cavaco!
Pela minha parte e não sei bem porquê, (vejam lá!) a única coisa que me vem à ideia é aquele velho aforismo Espanhol ( no mínimo Castelhano).
- Era um tipo tão pequeno, tão pequeno, que não lhe cabia a menor dúvida!
António Alves Barros Lopes
Afife – Janeiro de 2006
Qualquer semelhança com os dias de hoje não é coincidência