sexta-feira, 21 de janeiro de 2011

O MEU AVÔ LAVRADOR

JERÓNIMO AFONSO PEIXE
(O meu avô lavrador)
Morreu honesto mas pobre. Morreu pobre mas honesto. Como queiram.
Consequência do Priscilianismo remanescente das terras galaico-durienses com que fora educado. Teria que ser pobre por ser honesto.

O meu avô lavrador
subiu este monte ao mato
e dessa vida tão dura
deve ter ficado farto

- De fome teve fartura

De chancas e luvas grossas
roçou mato nas encostas
e nas chãos com dores nas costas
à enchada e à foucinha
da Rompensa à Fragalhinha
comendo brôa e sardinha
dividida por mais quatro

Deve ter ficado farto
o meu avô lavrador
desse trabalho tão duro
de cortar no monte mato

Deixou de ser estucador
encostou a régua ao muro

Deixou o branco do gesso
pelo negro do estrume
pagou na vida alto preço
e como era de costume
subiu este monte ao mato

Deve ter ficado farto
Pois o mato é coisa dura
não se corta com sardinha
de fome teve fartura
e deve ter ficado farto

Na curva d’ápertadinha
onde ouviu piar o gaio
virou um carro de mato
no alto calor de Maio

Buscou sombra não a teve
e bebeu na Fonte Seca
quando quis matar a sede

- Djió me cago em la punheta!

Dizia desesperado
quando algo corria mal
tinha aprendido este fado
em terras de Portugal,
na Galiza aqui ao lado
C’os galegos - gente estranha
que com os outros da Espanha
se cagam na Puta Madre

E voltava ao fim da tarde
com a família à noitinha
ao chegar a casa tinha
de conduto e sem presigo
caldo de unto p’ra jantar
na lareira da cozinha
(como se fosse castigo)

Mesmo assim ia falar,
terço na mão, ao Senhor
e rezando agradecia
aquilo que ao lavrador
tocava ao fim de um dia
igual ao anterior

E não sei se adormecia
se ao alto a noite inteira
não esquecia a canseira
do que tinha pra fazer
logo ao amanhecer
dum outro dia igual
de trabalhos para vencer
num estepôr de vida dura
que se levava afinal
em tempos de ditadura
no Minho de Portugal

- De fome havia fartura!

Rosa Alves do Couto da Casa do Manel Parente
Jerónimo Afonso Peixe da Casa do Moleiro Novo

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