Por uma deficiência congénita nunca entendi, nem nunca entenderei, Ambiente e Ordenamento fora da Agricultura ( eu prefiro chamar-lhe lavoura) ou esta fora daqueles. Nem o mar fora disto tudo.
Nasci, cresci, sempre vivi e ás tantas vou morrer lá, numa aldeia em que todos este elementos se conjugavam, se complementavam e sempre com o elemento humano na coordenação - Os lavradores.
E assim, estes, desde tempos imemoriais se adaptaram à sua circunstância e construíram um sistema em que todas essas vertentes eram respeitadas na sua interligação. Ordenaram o espaço. As veigas e outros terrenos aráveis, que a natureza tinha consolidado ou por deposição de aluviões ou por sedimentação, eram preservadas intocáveis pois se destinavam a produzir pão. Os montes eram utilizados para a retirada de matos que serviam para compostar os estrumes necessários aos terrenos de cultivo. Com esta acção minimizavam-se os incêndios aproveitando, ao mesmo tempo, a energia desse material. Também serviam para a pastorícia e produção de lenha e madeira. Mas como era necessário habitar numa qualquer área, esta, a área habitacional, não era uma área qualquer. A área "urbana" da aldeia situava-se precisamente nos terrenos de cota superior entre os terrenos aráveis e a meia encosta. Todas as infraestruturas da lavoura e de outras actividades, se construíam nessa área. Solução imanente da própria natureza pois a ninguém lhe passaria pela cabeça construir em terrenos de cultivo e, por outro lado, subir para lá da meia encosta seria penoso, tanto na construção como no dia a dia.
AREOSA. O MAR, A VEIGA, O CASARIO, O MONTE. (E ali a rotundinha em Camboelas. A malandra!)
E era a lavoura, com esse ordenamento, que cuidava daquilo a que chamamos o meio ambiente. Os montes, os rios, as levadas, os sistemas de rega, as limpezas e manutenção de caminhos, dos valados e regos foreiros, eram garantidas pela lavoura. Havia até um guarda campestre. Fiscalização estranha à aldeia era o Guarda Rios e o Cabo do Mar e o Guarda Floestal. Até o Mar dependia da lavoura ou esta do mar. De lá se retirava o argaço para meter nos campos e para dar de comer aos porcos.
AREOSA. O MAR, A VEIGA, O CASARIO, O MONTE. (E ali a rotundinha em Camboelas. A malandra!)
E era a lavoura, com esse ordenamento, que cuidava daquilo a que chamamos o meio ambiente. Os montes, os rios, as levadas, os sistemas de rega, as limpezas e manutenção de caminhos, dos valados e regos foreiros, eram garantidas pela lavoura. Havia até um guarda campestre. Fiscalização estranha à aldeia era o Guarda Rios e o Cabo do Mar e o Guarda Floestal. Até o Mar dependia da lavoura ou esta do mar. De lá se retirava o argaço para meter nos campos e para dar de comer aos porcos.
Havia leis consuetudinárias Os de Carrêço não frequentavam o Mar de Areosa e vice versa. Pescadores eram os próprios lavradores. Havia pesca no Porto de Vinha. Havia pesca no Lumiar. Os de Carreço içavam uma bandeira na chegada da sardinha e até os de Areosa iam lá comprá-la. Redes e trancadas nas cambôas era para a gente da aldeia que mantinham, contra tudo e contra todos, as paredes daquelas.
Daí que para mim. lavoura, ambiente e ordenamento é tudo (ou quase tudo) a mesma coisa.Ora esse equilíbrio que observava na minha aldeia, que afinal era o mesmo das aldeia vizinhas que conhecia, sempre o idealizava para no resto de Portugal. Entendia até que essa "ordem natural" fosse intocável e definitiva.
No entanto o progresso, o tal desenborbimento como diz o meu amigo Morada, se encarregou de alterar toda essa estrutura e o idílico boculismo da minha ingénua imaginação. E a minha aldeia tornou-se o microcosmo daquilo que sucedeu em Portugal. Ou, dito de outra forma, em Portugal sucederam, de uma forma ampliada, todos os males que atacaram a minha Aldeia .
Por todo o Portugal se destruíram terrenos aráveis com construções e cimento armado? - Na minha aldeia também.
Na minha aldeia o montes foram abandonados?
-Em Portugal também.
Em Portugal deram cabo das pescas??
-Na minha aldeia também.
Na minha aldeia a agricultura foi abandonada?
- Em Portugal também.
Em Portugal semearam-se pinheiros em terrenos de cultivo?
- Na minha aldeia também.
Na minha aldeia há mamarrachos por todo o lado?
-Em Portugal também!
Em Portugal a ruralidade foi atirada para um canto??
- Na minha aldeia também.
Em Portugal constrói-se em cima das linhas de água?
- Na minha aldeia também.
Na minha aldeia os montes ardem?
- Em Portugal também.
Em Portugal há a mania de que não somos um país rural?
- Na minha aldeia essa mania foi materializada por via administrativa fazendo de mim um citadino à força.
Na minha aldeia consporcaram as linhas de água?
- Em Portugal ribeiras e rios!
Portugal é a terra das rodovias e rotundas?
-A minha aldeia vai sendo!
Ora, para mim, tem toda a lógica ampliar para o país inteiro o tal equilíbrio entre agricultura, ordenamento e ambiente (mar incluído) que eu sempre admirei na minha aldeia (antes do descalabro).
Mas não sei se a esta ministerial fusão orgânica corresponde, da parte dos responsáveis, um sentido filosófico do que tudo isso significa.
A Ministra Assunção Cristas? Uma jurista?? Vivência urbana???
- Num sei!
Pensará como toda a classe média, urbana, que aquilo que se come vem do supermercado e não da terra?
Pensará como os privilegiados que as refeições brotam das respectivas cozinhas e depois jorram nas mesas dos gambrinos do reino?
Saberá que não há lavoura se não houver terreno de cultivo?
Achará que tanto dá ocupar um metro quadrado de terreno de pedras, mato e alguns pinheiros ( se os houver) como destruir um metro quadrado de terreno arável?
Terá a ideia que o terreno arável é o mais valioso que nos foi doado por milhões de anos de trabalho geológico, que pode ser destruído por um caterpilar qualquer, em minutos?
Terá reparado que esses mesmos terrenos nos chegaram fôfos e macios pelo trabalho de gerações?
Pensará que o betão e cimento armado dará origem ás hortas urbanas depois de ter impermeabilizado terrenos de cultivo?
Saberá que veiga é veiga e monte é monte?
Saberá que uma árvore, que leva quarenta anos a crescer se corta em cinco minutos?
Terá a ideia que por cada árvore cortada se deveriam plantar duas?
Saberá que no tempo dos afonsinhos, quando o poder não estava em Lisboa mas nos municípios, era isso mesmo que o Senado impunha ás aldeias?
Saberá que o gado medra com o olhar do dono?
Saberá que a bosta das vacas era tão limpa que dava até para fechar a porta do forno onde se cozia o pão?
Saberá que o Povo do Dr. Pedro só não continua a lavar no rio porque lhe destruíram o lavadouro, lhe roubaram o caudal ou porque lhe poluíram as águas ?
Saberá que ser lavrador não é uma profissão mas uma filosofia de vida. Que a lavoura não serve apenas para colocar couves no mercado a preços competitivos com os produtos importados?
Saberá que a própria PAC - Politica Agrícola Comum - "...reconhece que o agricultor para além de produtor de fibras e alimentos, tem outras funções como sejam as de agente fundamental do desenvolvimento e do ordenamento do território e da protecção do ambiente: e que, desse modo, o agricultor Europeu, é erigido à categoria de guardião do espaço rural."?
Terá reparado que ser pescador não é uma profissão mas uma temeridade? Que passa o dia ( pra bem dizer, a noite) a trabalhar em cima da sepultura!Terá reparado que a agricultura é a única actividade que funciona (auto) alimentando o seu próprio processo? Que é capaz de produzir sem recorrer ao exterior de sí própria?
(É que eu até desconfio de todos os labregos, ratinhos, saloios, chaparros, serrenhos, que vão para Lisboa. Uma vez lá esquecem-se de onde vieram. Calistos Elois da era moderna a quem lhes dão a beber da água de Santo António exactamente da mesma forma que os da minha aldeia bebem água de S. Mamede. Com os mesmos resultados. Depois, quando lhes convém impressionar, invocam as suas origens provincianas.)
Se fosse uma Luísa Schmidt eu não vacilaria!
No entanto haja esperança. Temos o Campelo na Secretário de Estado das Florestas e Desenvolvimento Rural, que pode ser que consiga fazer vingar na Mouraria e neste Portugal fisicamente Rural, mas gerido por iluminados de mentalidade urbana, os mesmos conceitos que defendeu na nossa Ponte de Lima que não sendo propriamente uma aldeia, recusou ser, porque desnecessário, cidade. Ficou-se por Vila e ainda bem!
Afife, Julho 2011
Parabéns pelo excelente post.
ResponderEliminarVou publicar no meu FB, se me permitir.